Rotina puxada é
recompensada com desenvolvimento de comunicação dos filhos
27/02/2016 17h54
Por Augusto Diniz
Mães contam como é difícil lidar com
um distúrbio que ainda é pouco conhecido e sofre com diagnósticos muitas vezes
equivocados
Na
foto, Ana Beatriz, de 3 anos, e a mãe Fabiana | Foto: Arquivo pessoal/Fabiana
Collavini
Os dois primeiros anos de vida de uma criança são
quando a fala é desenvolvida. Desde o choro às primeiras palavras, quando o
bebê começa a aprender a usar a língua, a boca, o lábio e o céu da boca para se
comunicar, os murmúrios começam a se tornar palavras nos primeiros meses de
vida até se tornarem frases completas curtas entre a idade de 1 e 2 anos.
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Mas nem sempre isso acontece. Quando uma criança
tem apraxia da fala, um distúrbio neurológico que atrapalha o desenvolvimento
motor da fala, a criança não consegue estabelecer a comunicação oral. É aí que
começa o problema de pais e mães ou responsáveis por filhos pequenos.
Essa rotina para pais e criança se torna puxada, já
que não há uma conexão e entendimento a partir da fala. É o caso de Fabiana
Covallini, de 38 anos, mãe da Ana Beatriz, de 3 anos. Bia, como Fabiana a
chama, começou a ser levada a sessões de fonoaudiologia a partir dos 11 meses.
Em casa, a dificuldade inicial aconteceu porque Bia
tinha dificuldade de balbuciar. Depois do primeiro ano de tratamento para
buscar uma resposta para a filha não conseguir se expressar através de sons,
houve a mudança de fonoaudióloga.
A segunda profissional que avaliou o caso de Bia
suspeitou de apraxia na fala. Até então Fabiana disse que não tinha a mínima
noção do que vinha a ser esse distúrbio.
“Era superestressante, a gente pulava de médico em
médico”, relata a dificuldade em achar um diagnóstico conclusivo para o motivo
de Bia não conseguir desenvolver a fala normalmente. Fabiana contou que levou a
filha a pediatras, neurologistas e outros profissionais de saúde até descobrir
o que Bia tinha em São Paulo.
Natural da capital paulista, Fabiana mora em
Goiânia há oito anos. Mas foi só em São Paulo que, ao procurar a fonoaudióloga
Elisabete Giusti, que teve a certeza que se tratava mesmo de apraxia na fala.
De acordo com Giusti, o diagnóstico ideal é feito
com 3 anos de idade, quando é possível ter certeza do distúrbio, mas sinais já
são notados a partir dos 2 anos. Bia teve o problema detectado cedo. “Bia fica
muito nervosa pela dificuldade de se comunicar, mas é uma criança
supersociável”, descreveu a mãe.
Desconhecimento
Como é um distúrbio pouco conhecido e também ainda
não muito reconhecido entre os profissionais de saúde brasileiros, como explica
Elisabete Giusti, acontecem casos de apraxia que são diagnosticados como
autismo ou outras síndromes como Down. “Tudo isso dificulta o tratamento
correto e o desenvolvimento da fala dessa criança”, afirma a fonoaudióloga.
No caso de Fabiana, que leva a filha de quatro a
cinco vezes por semana a sessões de fonoaudiologia e tem um acompanhamento
médico após o diagnóstico de apraxia em Bia, o desenvolvimento cognitivo
apresenta resultados. “Ela faz outras atividades que gosta, como balé e
capoeira.”
Todo avanço de Bia, com conta Fabiana, depende do
estímulo e acompanhamento familiar. “Acaba gerando mais desgaste e ela fica
mais cansada, mas eu tento, por exemplo, colocar ela para dormir antes das
sessões”, descreve. Mesmo quando descreve como “puxada” a rotina com a filha,
ela diz que o que importa é ver o desenvolvimento da filha.
Diagnóstico
tardio
Ao contrário de Bia, Caíque, que tem hoje 11 anos,
só teve o diagnóstico de apraxia na fala apresentado quando ele já tinha entre
5 e 6 anos. A mãe de Caíque, Cláudia Oliveira, de 44 anos, relata que precisou
também ir a São Paulo para encontrar um foniatra — otorrinolaringologista
especialista em foniatria, que é uma área médica que se dedica aos casos de
distúrbio dos sons.
“O Caíque começou o tratamento com 1 ano e 6 meses.
Ele demorou muito para começar a andar”, lembra Cláudia. A mãe diz que o garoto
não conseguia emitir nenhum som ao tentar falar.
O médico que diagnosticou Caíque em São Paulo foi
indicado por um parente de Cláudia que havia feito um tratamento de gagueira.
Mas as dificuldades continuaram depois de constatar que o caso do filho era
apraxia.
“Foi uma peregrinação para achar um fonoaudiólogo
em Goiânia que tivesse conhecimento do distúrbio.” Caíque passa por um
tratamento que inclui a comunicação aumentativa e alternativa (CAA), que, de
forma resumida, é um conjunto de estratégias e ferramentas para resolver
desafios comunicativos cotidianos.
Além de ter passado anos sem conseguir falar,
Caíque tem dificuldades motoras para executar movimentos finos, que são a
destreza de mãos e dedos. “Ele aprendeu a andar de bicicleta sozinho, mas tem
atividades que ele desenvolve de forma mais lenta”, explica Cláudia.
O que a mãe descreve com um “vocabulário mais
pobre” que filho tem, ela considera uma vitória, pois antes nem falar ele
conseguia. “Ele é uma criança muito resolvida. A comunicação melhorou bastante.
Antes ele não conseguia se comunicar. Imagine alguém que não consegue
transmitir aquilo que quer falar?”
Dificuldades
Para Cláudia, as dificuldades em encontrar médicos
especializados que tenham conhecimento e saibam tratar a apraxia são problemas
que dificultaram o início do tratamento correto do filho. “Se tivesse desde o
começo as informações que a gente tem hoje seria muito mais fácil”, descreveu.
A grande melhora do desenvolvimento motor da fala
no filho se deu de 2014 em diante. “Há mais ou menos um ano ele consulta com
uma psicóloga comportamental. Hoje é bem melhor.”
Mas a mãe afirma que nem sempre foi tão fácil assim
verificar desenvolvimento no caso de Caíque. “É muito difícil você tentar se
comunicar e não ser entendido. É difícil na escola, com os amigos”, explica.
Cláudia diz que as dificuldades de antes são as que motivam a busca por mais
informações, até mesmo para ajudar outras mães e famílias que lidam com esse
distúrbio.
“Tem muito diagnóstico que desespera, mãe sai
chorando do consultório, como quando dizem que a criança tem autismo e não é
autismo que a criança tem”, revela Cláudia. Segundo a mãe de Caíque, a luta das
mães, como ela e Fabiana, que fazem parte da Associação Brasileira de Apraxia
de Fala na Infância (Abrapraxia), é a de buscar mais informações sobre o
distúrbio e tratamento.
A entidade realizou um curso, ministrado pela
fonoaudióloga Elisabete Giusti, na sexta-feira (26/2) e neste sábado (27) até
as 18 horas, no auditório Valéria Perillo do Centro de Reabilitação e
Readaptação Doutor Henrique Santillo (Crer), direcionado a profissionais de
saúde e parentes sobre a apraxia na fala, seu diagnóstico e tratamento.
As mães, ao conversarem com o Jornal Opção sobre o distúrbio e
a rotina de conviver com a apraxia diariamente, tratam o assunto como uma
responsabilidade delas com a sociedade. “O que eu puder trazer para ajudar a
vida do Caíque eu vou atrás”, concluiu Cláudia.
FONTE: http://www.jornalopcao.com.br/ultimas-noticias/rotina-puxada-e-recompensada-com-desenvolvimento-de-comunicacao-dos-filhos-59831/
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